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quinta-feira, 30 de maio de 2013

Fraturas do Calcâneo

Autor: Dr Silvio Maffi
O calcâneo é o maior e mais volumoso osso do pé. Ele forma o calcanhar e suporta grande parte de todo o peso do corpo, principalmente na primeira fase da marcha quando, a cada passo, tocamos primeiramente o chão com a parte detrás do pé. Ele articula-se na face superior com o tálus e na face frontal com o cubóide.
Vários tendões e ligamentos prendem-se ao calcâneo, principalmente o tendão de Aquiles (ou tendão calcâneo) e a fáscia plantar, estruturas fortes e resistentes que transferem a força da perna para o pé e nos impulsionam para frente e para cima quando caminhamos, corremos ou pulamos.
Ele é envolto por uma camada especial de tecido adiposo (gordura) para absorção do impacto, presa por ligamentos que vão do osso até a pele e formam compartimentos que aprisionam essa gordura e impedem que ela se mova para as laterais do pé.
As fraturas do calcâneo são sempre um grande desafio para o ortopedista. São graves e complexas. Corresponde a 2% de todas as fraturas que ocorre no corpo humano e é a mais comum dos ossos do tarso (ossos da porção posterior do pé). Estão relacionadas aos traumas de grande impacto e de intensa energia cinética: quedas de altura e acidentes veiculares são as causas mais comuns e 90% acontecem em homens jovens em idade de trabalho, normalmente trabalhadores industriais ou da construção civil.
O diagnóstico radiológico das fraturas do calcâneo é feito através do raio X de ambos os pés (comparativo) e da tomografia computadorizada, que revela em detalhes os fragmentos e a extensão da fratura, além de possibilitar ao médico classificar a gravidade e planejar o tratamento.
Tomografia Computadorizada
Cerca de 75% dessas fraturas lesam as articulações do calcâneo, são chamadas de fraturas intra-articulares e acometem principalmente a articulação subtalar (articulação entre o calcâneo e o tálus). A articulação subtalar é responsável por parte dos movimentos para dentro e para fora do pé, isto é, movimentos de inversão e eversão. Por isso, esse tipo de fratura leva à diminuição ou perda completa desse movimento. O movimento para cima e para baixo do tornozelo (dorsiflexão e plantiflexão) geralmente não é afetado pelas fraturas do calcâneo.
      
Existem vários problemas associados com as fraturas do calcâneo. Um deles é o alargamento e a deformidade do osso em si. Outro é o afundamento e a irregularidade da articulação subtalar, que leva à artrose (desgaste e degeneração articular), com perda do movimento e dor de intensidade variada.
As fraturas do calcâneo também podem causar lesões da pele do calcanhar pelo grande edema (inchaço) que ocorre, inclusive comprimindo nervos e vasos sanguíneos que passam pela região (ver síndrome compartimental).
Fratura do Calcâneo - Edema Tenso
Fraturas pequenas e sem deslocamentos são menos comuns e podem ser tratadas conservadoramente, isto é, sem a necessidade de cirurgia. A maioria das fraturas, principalmente aquelas com deslocamento e lesão articular, necessitam de intervenção cirúrgica, com o objetivo de restaurar o tamanho e a estrutura do calcanhar.
Restaurar a forma e a dimensão do calcâneo com a maior precisão possível é muito difícil, pois as fraturas complexas possuem muitos fragmentos pequenos, difíceis de reconstituir. Recolocá-los e fixá-los em seu lugar é quase como tentar montar um quebra-cabeça completamente irregular.
O momento ideal para realizar a cirurgia é quando há o mínimo de edema (inchaço) da pele. Pode-se ter que esperar alguns dias com uma imobilização gessada e elevação do membro para que o edema regrida e seja possível o procedimento cirúrgico. Existem botas pneumáticas de compressão intermitente que aceleram esse processo, mas não são facilmente encontradas no Brasil.
O processo de redução e fixação interna é realizado através de uma incisão na parte lateral do calcanhar. O osso é montado e mantido no lugar com uma placa de metal e parafusos diversos. Este procedimento devolve uma forma mais anatômica do osso, diminui a probabilidade de desenvolver artrose e melhora a circulação sanguínea do pé.
     
     
Fixação com Placa e Parafusos                                               Rx Pós-operatório
Todavia, quando o calcâneo é severamente destruído e existem muitos fragmentos pequenos, incapacitando a montagem da articulação subtalar, esta deve ser fusionada. Isto é, o calcâneo é fixado ao tálus definitivamente, evitando assim o desenvolvimento de artrose dolorosa na articulação destruída. Os movimentos de inversão e eversão são perdidos após a fusão subtalar, mas há um retorno mais rápido às atividades e ao trabalho após este tipo de cirurgia (artrodese).
Após a cirurgia, utiliza-se uma bota imobilizadora rígida e o apoio não é permitido por aproximadamente 2 a 3 meses. Os pontos são retirados na segunda ou terceira semana. A fisioterapia e os exercícios para tentar maximizar a função do pé são iniciados após o primeiro mês de pós-operatório. O tempo de recuperação, em média, é de seis meses para esse tipo de fratura, podendo permanecer algum grau de incapacidade definitiva.

Possíveis Lesões Decorrentes da Fratura do Calcâneo:
Na evolução de uma fratura do calcâneo, há muitos problemas potenciais que podem ocorrer. Eles não dependem somente do tipo de tratamento empregado, mas também da gravidade da fratura, do tempo de evolução, das lesões associadas e dos cuidados que o paciente deve ter. Algumas possíveis lesões são:
1. Dor subtalar: Dor na parte detrás do calcanhar, do lado de fora do tornozelo. Ela está presente na articulação do calcanhar (articulação subtalar) e é geralmente causada pelo desgaste e irregularidade (artrose) dessa articulação.
2. Rigidez na articulação subtalar: Independente do tipo de tratamento, existe sempre alguma limitação do movimento para dentro e para fora do pé. Isso é chamado de inversão e eversão. O problema ocorre devido aos danos da superfície da cartilagem da articulação, que é frequentemente associada com a artrose.
3. Alargamento do calcanhar e dificuldade com uso de calçados: Esse problema ocorre principalmente quando a cirurgia não é realizada e o calcâneo permanece deformado.
4. Dor na parte externa do calcanhar e na parte externa do tornozelo: Pode ocorre devido a uma lesão dos tendões (tendões fibulares). Este é um problema comum quando a cirurgia não é realizada e ocorre devido ao alargamento do osso do calcanhar, que comprime e machuca os tendões fibulares.
5. Dor plantar: Pode ser um problema grave e de difícil tratamento, principalmente quando a gordura da planta do pé sofre traumatismo ou ferimento no momento do trauma.
6. Dor e ardência plantar e na parte interna do pé: Isso pode ocorrer como resultado do alargamento do calcanhar na porção interna do pé e é provocada pela irritação do nervo tibial, chamada de síndrome do túnel do tarso.

Tratamento da Artrose da Articulação do Calcanhar (Artrose Subtalar):
A artrose da articulação subtalar causa rigidez da parte detrás do pé, dificultando a acomodação do pé ao solo e causando dor na parte externa e na lateral do tornozelo. Andar em terreno irregular é difícil, pois o movimento de inversão e eversão estão bloqueados ou muito limitados.
O tratamento sem cirurgia pode ser feito com o uso de medicação antinflamatória, fisioterapia e infiltração de corticóide na articulação subtalar, além do uso órteses para sustentação e imobilização da articulação desgastada.
O tratamento cirúrgico é indicado caso a dor seja incapacitante e dificulte o paciente para retornar ao trabalho e à atividade diária. Há diferentes tipos de cirurgia que podem ser executadas, determinadas pela gravidade da deformidade, o grau de artrose e outras alterações concomitantes.
Normalmente a fusão da articulação dolorosa, chamada de artrodese, alivia a dor e promove uma melhor condição para o paciente. Quando permanece o alargamento do calcanhar, causando ou não dor nos tendões fibulares, pode-se associar a osteotomia lateral (corte ósseo lateral) juntamente com a artrodese.
Quando a deformidade do calcanhar é grave, a fusão da articulação subtalar não é o suficiente, podendo ser necessário o uso de enxerto ósseo, retirado do próprio paciente, para reconstruir uma dimensão e uma forma mais aceitável anatomicamente.

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