quarta-feira, 25 de maio de 2011

Neuropsicologia: teoria e avaliação1

Autores: Christian Haag Kristensen e Maria Alice de Mattos Pimenta Parente

A neuropsicologia pode ser situada como uma disciplina científica dentro da grande área de neurociências, ocupando-se com o estudo das relações entre funções cerebrais (preservadas ou alteradas), cognição e comportamento. Neste capítulo, são inicialmente discutidos aspectos históricos desta relação, com especial ênfase àqueles que propiciaram o surgimento da neuropsicologia. Logo após, os principais avanços em avaliação neuropsicológica são delineados, desde a investigação de lesões até o emprego de baterias
estruturadas. Ao final do capítulo, a neuropsicologia cognitiva é apresentada, com breve referência à formação do neuropsicólogo.

Cérebro, cognição e comportamento

No século XIX, nasceram dois homens que mudaram radicalmente a forma pela qual pensamos sobre nós mesmos: Charles Darwin (1809-1882) e Sigmund Freud (1856-1939).
Em sua obra mais conhecida, A origem das espécies por meio da seleção natural, ou a preservação das raças favorecidas na luta pela vida, publicada em 1859, Darwin apresentou duas teses distintas: a primeira, mais aceitável na época, era de que os organismos descenderam com modificações a partir de ancestrais comuns e a segunda, de que o fator principal de modificação era o efeito da seleção natural sobre a variação individual (Futuyma, 1992). Darwin percebeu as conseqüências de suas afirmações e escreveu, no capítulo final desta obra, que seriam abertos novos campos para pesquisas mais relevantes e que o estudo da psicologia seria baseado em novos alicerces. Embora tenha sido reconhecido pela fundação da psicanálise, Freud iniciou sua carreira pesquisando farmacologia (estudando as propriedades da cocaína), neurologia (sua contribuição para o estudo da afasia foi relevante) e técnicas de visualização de neurônios – o que incluiríamos hoje dentro da pesquisa básica em neurociências. Influenciado pelas idéias de Darwin, Freud preocupou-se inicialmente com as origens do sistema nervoso, investigando então este sistema em um peixe muito primitivo (Sacks, 1998). Em uma de suas obras menos conhecidas, Um projeto para uma psicologia científica (1895), Freud propôs que os mecanismos cognitivos relacionados aos fenômenos mentais normais e patológicos poderiam ser explicados através do estudo organizado e rigoroso dos sistemas cerebrais (Andreasen, 1997).

1 Referência original:

Kristensen, C. H., & Parente, M. A. M. P. (2001). Neuropsicologia: Teoria e avaliação. Em Psicologia para
Leigo (pp. 32-40). Porto Alegre: Conceito.

Embora Freud tenha colocado de lado a investigação em neurociências, justamente por perceber as limitações tecnológicas existentes na época, ele nunca desistiu da idéia de identificar uma base biológica para os processos e condições psicológicas.
Por incrível que possa parecer, ainda hoje, nesse início de século XXI, as contribuições desses dois expoentes ainda não foram plenamente reconhecidas. Frente à pergunta “De onde viemos?”, explicações divinas ainda são argumentos frequentemente utilizados para justificar nossa origem, na assim chamada doutrina criacionista. Se a explicação evolucionista não é amplamente aceita entre o público leigo para explicar nossa origem, o que dizer então da utilização dos conceitos de seleção natural e seleção sexual (Miller, 2001; Pinker, 1998; Wright, 1994) para explicar a mente humana? Aliás, uma questão a ser colocada é exatamente esta: “O que é a mente humana?”
Embora uma tentativa de síntese seja sempre algo arriscado em uma disciplina emergente, talvez seja necessário enfrentar estas questões desde a perspectiva do que atualmente concebemos como neurociências. Uma primeira resposta então, seria de que a mente é a expressão da atividade do cérebro. O cérebro, por sua vez, é o mais complexo produto da evolução humana, só sendo razoavelmente concebível através dos mecanismos de seleção natural e seleção sexual. Mas – e talvez esse seja o grande avanço das últimas décadas, como demonstrado nos exemplos de influências ambientais sobre a plasticidade cerebral – a experiência mental, por sua vez, também afeta o cérebro. Por exemplo, atualmente é possível identificar estudos empíricos demonstrando que o aprendizado é acompanhado por modificações da eficácia das conexões neurais, levando assim a uma reformulação de conceitos sobre a interação entre processos ambientais e biológicos na determinação de padrões de comportamento (Kandel, 1997). Quando se aplica essa lógica aos padrões desviantes do comportamento, é necessário rever a distinção atualmente insustentável em psicopatologia, que separa doenças orgânicas de doenças funcionais. Um crescente volume de dados sugere uma nova perspectiva, na qual a doença mental deve ser conceituada como transtornos da mente que se originam do cérebro. Conforme Kandel (1997), a questão deve ser formulada como segue: Como os processos biológicos produzem os eventos mentais e como, por sua vez, os fatores sociais modulam a estrutura biológica do cérebro?
Voltando ao século XIX, vamos encontrar algumas das primeiras investigações – umas

menos outras mais científicas – na tentativa de estabelecer relações entre cérebro, mente e comportamento. A abordagem frenológica, embora tenha sua origem com o trabalho de Franz Joseph Gall (1757-1828) no século anterior, contaminou profundamente o pensamento médico (mas também o senso comum) da época. Gall, ao procurar relacionar as depressões e protuberâncias do crânio com características de personalidade das pessoas por ele examinadas, acabou sendo um importante proponente da localização das funções mentais.
Embora o mérito de suas investigações seja questionável, não é possível negar que foi ele quem abriu caminho para uma série de abordagens que culminariam, em 1861, com a descrição de Paul Broca (1824-1880) sobre o resultado de autópsia realizada em um paciente que apresentara em vida um distúrbio da fala. Através do método anátomo-clínico, Broca demonstrara a existência de uma lesão na região posterior do hemisfério esquerdo, relacionando-a com o distúrbio de produção da fala (afasia). Mas se existe uma relação entre áreas específicas do cérebro e funções cognitivas superiores, como a linguagem, existiria também alguma ligação entre o cérebro e, digamos, características de personalidade?
Voltemos mais uma vez ao século XIX, mas desta vez vamos nos deter em um acidente ocorrido com um capataz de construção civil que teve a porção anterior de seu cérebro atravessada por um barrote de ferro. E sobreviveu! O acidente com Phineas Gage (esse era o seu nome) ocorreu em 1848 e foram relatadas por John Harlow, o médico que o acompanhou, as profundas mudanças de comportamento observadas. Após o acidente, de forma totalmente contraditória ao seu comportamento anterior, Gage passou a apresentar um conjunto de características que, hoje, chamaríamos de anti-sociais (desconsideração pelas convenções sociais e princípios éticos), além de uma incapacidade para planejar ações em prol de sua sobrevivência (Damásio, 1996).
Na época, por uma conjunção de circunstâncias técnicas e históricas, o trabalho de Harlow não teve repercussão. Harlow não conseguiu determinar precisamente a natureza da lesão, situando-a vagamente no lobo frontal. Além disso, existia o problema de que Broca descrevera alterações da fala em uma área circunscrita do lobo frontal, e Gage não apresentava alterações da fala (Damásio, 1996). Mas sobretudo, parecia pouco provável a idéia de situar no cérebro algo como a capacidade moral ou o comportamento social. Vale lembrar que nosso conhecido Gall fora expulso de Viena em 1805 justamente por defender uma proposta materialista para a mente humana. Na concepção de Gall, existiriam locais cerebrais específicos para faculdades complexas como a benevolência, a espiritualidade, o amor parental e a destrutividade. Nestas idas e vindas históricas, em uma visão comumente aceita, é possível dizer que a neuropsicologia vai inicialmente se delinear a partir das investigações de Broca e outros sobre os transtornos da fala. Posteriormente, foram enfatizadas outras funções a partir dos estudos sobre atenção, percepção visual e auditiva, memória, lateralização e, mais recentemente, sobre o processamento das emoções e funções relacionadas a áreas sub-corticais e pré-frontais.
Apenas para dimensionar a mudança histórica na aceitação de algumas idéias, argumentos favoráveis à localização cerebral de áreas relacionadas ao comportamento anti-social – algo inaceitável há um século e meio atrás, hoje são recebidos com destaque em periódicos científicos (Damásio, 2000; Raine e cols., 2000).

Avanços em neuropsicologia e avaliação neuropsicológica

A avaliação neuropsicológica surgiu com a função de buscar correlações entre achados neuroanatômicos e falhas cognitivas presentes em pacientes com lesões cerebrais evidentes. Seu progresso sempre dependeu de uma sincronia entre um avanço tecnológico e conceptual sobre as relações entre cérebro e cognição (Lezak, 1983). Grandes mudanças ocorreram em seus métodos, parte decorrente dos avanços tecnológicos durante os 135 anos de existência da neuropsicologia, parte decorrente de sua abrangência profissional.
Inicialmente, a correlação anátomo-clínica era realizada a partir da observação clínica de casos únicos comparados com resultados de análises anatômicas post mortem. Não há dúvidas que as duas guerras mundiais promoveram um grande avanço na avaliação neuropsicológica. Surgiram técnicas que permitiram a investigação do funcionamento neural, como o osciloscópio e a amplificação eletrônica. A prática neurocirúrgica foi difundida, de forma que as correlações anátomo-clínicas passaram a contar com os relatos dos neurocirurgiões comparados com a avaliação clínica. As conquistas tecnológicas cresceram exponencialmente, e em aproximadamente duas décadas, as informações anatômicas passam a ter como base os registros de imagens: surge a tomografia computadorizada, ainda com pouca resolução e, mais tarde, a ressonância magnética, que possibilita maior precisão quanto à região cerebral lesada. O maior avanço vem com as imagens funcionais – o SPECT, o PET e a ressonância magnética funcional – que permitem uma correlação on line, ou seja, é possível observar as áreas cerebrais ativadas enquanto o paciente realiza uma atividade. Entretanto, esses exames ainda têm suas limitações para o trabalho clínico, não apenas pelo alto custo e difícil acesso, como também por sua característica fundamentalmente experimental. Entre outras razões, o simples fato do paciente encontrar-se deitado, dentro de uma enorme máquina, com limitações de movimento de cabeça, restringe a avaliação a funções bastante específicas. Por esta razão, ainda as correlações off-line são mais adequadas quando se procura um diagnóstico, uma proposta terapêutica ou quando se investiga a atuação do paciente em seu meio.
As grandes guerras também foram responsáveis pela participação de psicólogos no estudo da relação entre cérebro e funções cognitivas devido à grande população de pacientes com traumatismos, envolvendo um maior número de profissionais interessados na avaliação e no trabalho de recuperação neuropsicológica. Em três aspectos a psicologia contribuiu com o desenvolvimento da neuropsicologia: (1) aprimoramento dos métodos de avaliação das funções cognitivas, (2) apresentação de bases teóricas sobre a cognição e a noção de processos cognitivos e suas rupturas e (3) métodos de recuperação de pacientes portadores de dificuldades cognitivas decorrentes de lesões cerebrais.
Inicialmente, a contribuição da psicologia para a neuropsicologia foi a formação de instrumentos de avaliação adequados. Podemos observar que nos anos pós-guerra são utilizados instrumentos de outras áreas psicológicas, principalmente os testes de inteligência, assim como são construídas as baterias neuropsicológicas.

Baterias neuropsicológicas

Em 1949, Allen propõe a utilização do Wechsler-Bellevue no exame de pacientes com traumatismo encefálico (Alfano & Saltz, 2000), com a finalidade de realizar uma observação empírica dos distúrbios e uma estimativa da inteligência pré-mórbida dos pacientes. Ambas finalidades continuam importantes no trabalho clínico. Primeiramente, as observações empíricas têm sido úteis para o conhecimento de novas síndromes e de novas doenças, entretanto a utilização exclusiva de escalas de QI não possibilita o exame de diversas funções cognitivas que podem estar seletivamente falhas, tais como: atenção, linguagem, funções motoras e, principalmente, funções executivas (Lezak, 1983). Por outro lado, uma estimativa da inteligência pré-mórbida exige métodos estatísticos sofisticados, como o uso de algoritmos de regressão, ou medidas de desempenho de funções que se encontram preservadas (Alfano & Saltz, 2000).
A observação de que a lesão cerebral pode ser seletiva, ou seja, afetar uma função cognitiva e não outra(s), levou vários neuropsicólogos a desenvolverem baterias neuropsicológicas mais refinadas. Segundo Casanova (1987) a primeira bateria de testes apareceu em 1935, criada por Weisenburg e McBride. Estas baterias, de forma geral, constituem-se de um agrupamento de diferentes provas, que possibilitam examinar, de forma isolada, cada uma das funções cognitivas, que podem ser agrupadas em cinco grandes componentes: (1) ativação e atenção, observando-se o estado de vigilância e a capacidade de focalização e manutenção da atenção; (2) memória, analisando-se os diferentes sistemas de memória dentro de diferentes modalidades, visual ou auditiva; (3) controle emocional; (4) cognição, avaliando-se a gnosis (reconhecimento modal específico através de analisadores visual, auditivo e somestésico), o processamento conceitual e a resposta motora, seja ela verbal ou não verbal, com ênfase nas capacidades lingüísticas, orais e gráficas; e por fim, (5) a função regulatória, atualmente denominada função executiva, que mantém um controle global com planos, intenções, objetivos e formas concretas de ação.
Podemos observar na tabela abaixo os componentes valorizados pelo exame do estado mental de Strub e Black (1985), uma bateria simples, que tem como característica ser facilmente aplicada pelos diferentes profissionais que atuam na neuropsicologia e áreas afins.
Baterias mais sofisticadas foram montadas pelos grandes centros neuropsicológicos (Tupper, 2000), como o teste de Barcelona (Casanova, 1987), Halstead-Reitan Neuropsychological Test, Luria Nebraska Neurospychological Battery, Iowa-Benton Neuropsychological Assessment, entre outras. Ao avaliar cada componente cognitivo, as baterias possibilitam uma análise sindrômica, ou seja, agrupar vários distúrbios de um paciente numa síndrome. Por exemplo, se o paciente possui dificuldades atencionais, falhas de memória, boa linguagem e percepção visual, assim como uma desorganização em suas ações ele deve ser portador de uma disfunção nas funções executivas. Como os componentes valorizados pelas baterias neuropsicológicas decorrem da atuação de sistemas e grupos neurais, as baterias são um instrumento interessante para as correlações off-line e possibilitam inferências sobre possíveis locais de lesão.

Tabela 1: Componentes da avaliação do estado mental de Strub e Black (1985)

· Dados iniciais sobre o paciente: sexo, idade, profissão, dominância manual, dados neurológicos

· Observação do estado físico do paciente

· Estado emocional: queixas; preocupações; experiências; tendências obsessivas ou paranóicas; alucinações; consciência ou compreensão de seu estado

· Nível de consciência; atenção e concentração

· Orientação espaço-temporal

· Linguagem oral e linguagem escrita

· Características do pensamento

· Capacidade perceptual e capacidade práxica

· Memória

· Capacidade intelectual; cálculos elementares; diferenças e semelhanças

É preciso enfatizar que é um erro afirmar categoricamente que o paciente tem uma falha em uma determinada região no cérebro quando vai mal numa prova (por exemplo, ao se constatar dificuldades em repetição, afirmar que sua lesão encontra-se nos fascículos arqueados; ou ao se constatar dificuldades de memória, afirmar que sua lesão encontra-se no lobo temporal, etc.). A vice-versa também é verdadeira e, infelizmente, mais freqüente: é um erro julgar uma falha cognitiva apenas se observando o local da lesão num exame de imagem ou coletando dados operatórios. Apesar dos inúmeros estudos da neuropsicologia e das neurociências mostrarem que determinadas áreas cerebrais têm maior participação em uma função cognitiva, um mesmo distúrbio pode decorrer de lesões em diferentes regiões cerebrais, assim como uma lesão extensa pode causar um distúrbio leve ou vice-versa. Cabe lembrar, também que características individuais podem influir numa alteração da organização cerebral standard. Os estudos preocupados com dominância hemisférica têm observado que a organização cerebral depende de fatores orgânicos (idade, sexo, dominância manual) assim como de fatores sociais (escolaridade, conhecimento de uma ou mais línguas, tipo de escrita utilizada). Desta forma, a correlação anátomo-clínica precisa sempre dos dois elementos: uma informação do local lesado (resultados de imagens cerebrais ou dados operatórios) e uma boa avaliação neuropsicológica.

Neuropsicologia cognitiva

A partir dos anos 70, modelos teóricos da psicologia cognitiva têm sido utilizados para a avaliação e a caracterização dos distúrbios causados por uma lesão cerebral. São introduzidos métodos mais precisos de tempo de reação e de resposta e cada uma das funções cognitivas é avaliada de forma mais minuciosa, buscando-se o processo de uma função complexa que se encontra falho. Ao invés de apenas caracterizar as síndromes, passa-se a buscar como uma falha afeta o funcionamento de cada função cognitiva. Se o diagnóstico sindrômico necessitava de um raciocínio somatório de sinais patológicos, agora um raciocínio interpretativo procura explicar o comportamento em tarefas específicas, de acordo com modelos teóricos sobre o funcionamento cognitivo normal (Seron & Deloche, 1994). A neuropsicologia passa a interagir estreitamente com a psicologia cognitiva, principalmente com os modelos de processamento de informação, sejam eles simbólicos ou conexionistas.
Conseqüentemente, a avaliação que focalizava o onde passa a focalizar o como. Esta mudança de enfoque vai ter duas conseqüências no trabalho do neuropsicólogo: uma estreita relação com métodos de reabilitação das capacidades cognitivas falhas e o surgimento da psicopatologia cognitiva que, aproveitando os métodos utilizados com lesados cerebrais, estuda os distúrbios cognitivos associados de pacientes psiquiátricos, tendo como finalidade sua re-inserção social.
Os trabalhos de reabilitação cognitiva também foram muito desenvolvidos após as grandes guerras, quando os governos se sentiram responsáveis pelos estragos causados em uma população bastante jovem e potencialmente produtiva. Por muitos anos, os métodos de recuperação focalizavam basicamente aos distúrbios de linguagem (Luria, 1970; Schuell e cols., 1964), sendo o trabalho de reabilitação realizado por fonoaudiólogos. Recentemente, com o aumento dos estudos sobre distúrbios de memória, de atenção e de funções executivas, assim como devido a um grande número de traumatismos frontais causados por acidentes de trânsito, psicólogos interessaram-se pela reabilitação desses distúrbios. Foram desenvolvidos métodos baseados em modelos teóricos do processamento da informação que procuravam aproveitar os processamentos mantidos e desenvolver diferentes estratégias para compensar as disfunções perceptuais, de memória, atenção ou de funções executivas (Azouvi, Perrier, & Van der Linden, 1999).

A partir dessa visão funcionalista, os conceitos e métodos da neuropsicologia cognitiva e das neurociências contribuem para um novo campo de investigação e de atuação profissional: a psicopatologia cognitiva. A psicopatologia cognitiva propõe-se a descrever as disfunções cognitivas associadas aos problemas psiquiátricos, compreender os mecanismos funcionais dessas perturbações e desenvolver métodos terapêuticos (Musiol & Trognon, 2000; Van der Linden, Danion, & Agniel, 2000). Como os distúrbios psiquiátricos se caracterizam pela disfunção de aspectos mais complexos do comportamento e da afetividade, a psicopatologia cognitiva focaliza as funções cognitivas complexas e sua interação com a afetividade, a consciência e o controle da ação.

Na realidade não existe um limite divisório entre a neuropsicologia cognitiva e a psicopatologia cognitiva quanto ao tipo de funções avaliadas. Isto porque algumas lesões cerebrais causam grandes distúrbios de controle de emoções, como também alguns distúrbios psiquiátricos podem, em alguns casos, serem secundários a uma alteração de comportamento mais elementar.

Finalmente, a formação do psicólogo em neuropsicologia e em psicopatologia cognitiva depende, atualmente, de estudos após sua graduação. Estes estudos devem abranger um aprofundamento de neurofisiologia e de conhecimentos atuais em neurociências, bem como conhecimentos gerais da clínica neurológica e psiquiátrica. Ele deve também ter um conhecimento aprofundado dos modelos da psicologia cognitiva e de métodos de avaliação e de reabilitação específicos para pacientes com distúrbios ou disfunções neurológicas e psiquiátricas.

Referências

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Azouvi, P., Perrier, D., & Van der Linden, M. (1999). La Reéducation en neuropsychologie: étude de cas. Marseille: Solal.

Casanova, J.P. (1987). La exploración neuropsicológica. Barcelona: Editorial MCR.

Damásio, A. R. (1996). O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano. São Paulo: Companhia das Letras.

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Miller, G. F. (2000). A mente seletiva: Como a escolha sexual influenciou a evolução da natureza humana. Rio de Janeiro: Campus.

Musiol, M. & Trognon, A. (2000). Éléments de psychopathologie cognitive: le discours schizophrène. Paris: Armand Colin.

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Tupper, D.E. (2000). Introduction: Neuropsychological assessment après Luria. Neuropsychological Review, 9 (2) 57-61.

Van der Linden, M., Danion, J.-M., & Agniel, A. (2000). La psychopathologie: une approche cognitive et neuropsychologique. Marseille: Solal.

Wright, R. (1994). The moral animal: The new science of evolutionary psychology. New York: Pantheon.

Sobre os autores

Christian Haag Kristensen é Psicólogo (PUCRS), Mestre em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS),
Pesquisador do Laboratório de Neurociências (UNISINOS) e Professor do Curso de Psicologia (UNISINOS).
Atualmente cursa o Doutorado em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS).

Maria Alice de Mattos Pimenta Parente é Doutora em Psicologia (USP), Pós-Doutora pela Universidade
de Montreal (Canadá), Professora do Departamento de Psicologia do Desenvolvimento no Instituto de Psicologia (UFRGS) e Professora do Curso de Pós-Graduação em Psicologia do Desenvolvimento (UFRGS).

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